Justiça em um mundo globalizado

A autora Nancy Fraser faz uma revisão de trabalhos anteriores em que ela focalizou a questão da justiça. Anteriormente analisou as disputas acerca da justiça tendo como pressuposto o que a autora denominou enquadramento Keynesiano-Westfaliano. Esse enquadramento se diz respeito às novas demandas geradas peloas novas configurações que o Estado assume com o advento da globalização, o fim da Guerra Fria e o surgimento de uma opinião pública transnacional. Segundo a autora, existem aspectos econômicos e políticos que produziram um rompimento com o Estado Keynesiano-Wetfaliano. Esse tipo de Estado supunha que as discussões sobre justiça se bastaqvam nas relações entre cisadãos debatidas nos públicos nacionais e equacionadas pelo Estado. Os temas relativos às reivindicações por justiça, redistribuição socioeconômica, reivindicações pelo reconhecimento legal e cultural foram as balizas desse momento que se inicia em 1970 e finaliza em 1989.
Até então, os Estados elaboravam políticas a partir de uma ordem mundial determinada pelo Pós-Segunda Guerra Mundial desenhada com a Conferência de Bretton Woods que reordenou economicamente o mundo a partir dos interesses estadunidenses de inserção de sua economia em mercados fechados. A tônica desse momento foi a de proporcionar aos EUA o caráter de protagonistas econômicos mundiais na reconstrução da Europa com a criação de instituições financeiras como o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento. Bretton Woods replicava o modelo econômico Keynesiano-Westfaliano que também preconizava o respeito às fronteiras dos Estados Nacionais e colocava o Estado como ator principal na solução de problemas de desigualdade econômica com a acomodação das diferenças entre os cidadãos. Nesse sentido o Estado atuaria como um mecanismo acomodação das diferenças sociais entre os cidadãos. O rompimento com este Estado se inicia a partir do momento em que passam a questionar além do “ que” e “quem”, mas “como” beneficiar parcelas da população com políticas públicas.
Hoje a globalização e o mundo Pós-Guerra Fria impõe processos sociais que moldam as vidas das pessoas, pois as decisões tomadas nos Estados nacionais impactam a vida de cidadãos para além da fronteira. Segundo a autora, esse processo foi desencadeado pela financeirização das relações de produção, ou seja, pelo capital financeiro ter assumido uma importância jamais vislumbrada criando grupos de investidores que pressionam os Estados nacionais a se conectarem a uma economia globalizada, de produção mundializada. O processo de redistribuição atualmente tem que levar em conta, portanto: a produção transnacionalizada, a diminuição de empregos, a diminuição dos meios regulatórios dos Estados Nacionais e o papel dos Sindicatos que passaram a buscar aliados estrangeiros para condução de suas disputas.
Assim, o questionamento sobre justiça, tendo em vista esse contexto, assume outros contornos. Não apenas o que está em disputa deve ser tema de debate, mas também “quem” está em disputa e “como” a disputa é conduzida. Desta forma, a autora elabora um conjunto de questões para que o conceito de justiça seja revisionado à luz dessas condições acima expostas. Num primeiro momento se deve considerar “ ...quanta desigualdade econômica a justiça permite, quanta redistribuição é requerida, e de acordo com qual princípio da justiça distributiva?” (p.17). Da mesma forma “... o que constitui respeito igualitário, quais tipos de diferenças merecem reconhecimento público, e por quais meios?”.
Em um segundo momento, surgem questões denominadas de meta-nível. Questões que permitem uma inflexão mais aprofundada a respeito da relação entre justiça e atores sociais que lutam por ou a promovem. Assim é fundamental questionarmos “...qual é o enquadramento, que é adequado para se considerarem às questões de justiça de primeira ordem?”. E num nível mais profundo “... quem são os sujeitos relevantes titulares de uma justa distribuição ou de um reconhecimento recíproco no caso em questão?”.
A partir dessas duas ordem de questionamentos o que está em pauta é o enquadramento do conceito de justiça. Segundo a autora até o momento faltam instrumentos conceituais para refletir sobre a meta questão do enquadramento. O artigo propõe uma estratégia para lidar com o problema do enquadramento. A análise deverá contemplar, segundo Fraser, a tridimensionalidade da questão da justiça dividida da seguinte forma: dimensão política da representação, dimensão econômica da distribuição e dimensão cultural do reconhecimento. Fraser argumenta que é a dimensão política da representação que será capaz de englobar os três níveis. Nesse momento a autora fixa uma mudança pragmática: o que o enquadramento Keynesiano-Westfaliano fixou como a teoria da justiça deve agora se tornar a teoria da justiça democrática pós-westfaliana.

FRASER, Nancy. Reenquadrando a justiça em um mundo globalizado. Revista Lua Nova, São Paulo, número 77, páginas 11 – 77, 2009.




Rodrigo Alberto Toledo
Doutorando em Sociologia com período sanduíche na Universidade de Salamanca, USAL, Instituto Iberoamerica e Centro de Estudos Brasileiros, tendo como objeto de pesquisa o processo de planejamento urbano da cidade de Araraquara e sua relação com a FAU-USP e processos participativos na formulação de políticas públicas urbanas. Tem Mestrado Acadêmico em Sociologia e Especialização em Gestão Pública e Gerência de Cidades (2001) pela UNESP-FCLAr-PPG. Licenciatura Plena e Bacharelado em Ciências Sociais pela UNESP-FCLAr. Foi presidente da ONG Araraquara Viva e coordenou inúmeros projetos socioambientais que foram aprovados pelo Ministério da Cultura, Lei Rouanet. É bolsista do programa CAPES.

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